Bem-vindos a Milão!
Devido à sua história e pela influência que exerce no panorama sociocultural italiano, é considerada uma das cidades mais emblemáticas de Itália: Bem-vindos a Milão!
Provas arqueológicas do século XIX certificam que Milão, atual capital da região da Lombardia, nasceu como uma pequena aldeia que, pouco a pouco, soube crescer e se fortalecer. A origem celta do seu nome, Medhelan, “cidade sacra”, descreve perfeitamente as características deste lugar, rico por natureza e favorecido pela sua relevância geográfica. A história de Belloveso e dos gauleses Biturigi, fundadores da capital lombarda, permitem que imaginemos um território fértil, frutífero, capaz de abastecer de comida a uma população enorme.
No entanto, realmente pouco se sabe desta Milão celta, bem como da primeira Milão romana, Mediolanum, a arqueologia fez com que chegasse notícias sobre o descobrimento de armazéns e enormes depósitos de produtos alimentares. Além disso, a distância do mar nunca foi um obstáculo para obter peixe, obviamente de rio. Neste sentido, algumas fontes relatam que já desde o século XII existia um mercado dedicado ao peixe, dividido por tamanhos, grandes e pequenos. A condição de absoluto florescimento que envolvia Milão naquela época não foi suficiente para a deixar imune às inúmeras carestias e guerras protagonizadas nos séculos XVI e XVII. Devido à terrível falta de matéria-prima os milaneses foram obrigados a abandonar os campos e encontraram na polenta, à base de farinhas de cereais e milho, a sua salvação. Este prato tão popular, que sobreviveu ao longo dos séculos até chegar às nossas mesas, serviu para superar a fome, no entanto acabou por ser também o principal responsável da pelagra, doença causada por deficiência vitamínica.
O que mudou por completo esta situação, bem como os hábitos alimentares dos milaneses foi a difusão do cultivo de arroz, introduzido na metade do século XV. Esta renovada produtividade é devida, entre outras coisas, às obras de beneficiação financiadas pelas ricas famílias Visconti e Sforza, que passaram à história como os nobres e “donos” da cidade. Pelo impulsionamento económico e o bem-estar dispensado pela família Sforza, Milão começou a converter-se no centro de referência económico e comercial que conhecemos hoje.
Sempre aberta a acolher todas as tendências, da moda ou culturais, a atual capital financeira italiana tem na sua origem uma tradição gastronómica bastante humilde. A cozinha ambrosiana, como se conhece em homenagem ao padroeiro da cidade, Sant’Ambrogio, é na realidade uma cozinha pobre, camponesa, protagonizada pelas verduras e pelas carnes de vitela e porco, cozinhadas e condimentadas com manteiga. No entanto, as influências que chegam à cozinha milanesa são inúmeras, e a maioria partilha predileção pelas carnes, pelos miúdos e outros saborosos restos. Precisamente devido à presença destes ingredientes nas suas receitas, a alcunha dos milaneses é “busecconi”, que em dialeto quer dizer panções. Da mesma forma, em virtude destas influências, a tradição gastronómica de Milão também partilha pratos com a cozinha austríaca. Assim, a famosa “cotoletta”, composta por um filete de vitela panado com pão ralado, alho, salsa e passado pela frigideira, tem a sua origem na cidade de Viena, enquanto o pão “michetta” deve o seu nome ao pão austríaco Kaisersemmel, também chamado “micca”. Além disso, uma receita muito querida pela gente do lugar é a “cassoeula”, de origem espanhola. Composta pelos despojos do porco, entrecosto, couratos, orelhas, joelho, etc., cozinhados com couve branca, o prato na sua essência leva todos aqueles ingredientes que os nobres da época rejeitavam. No entanto, o autêntico rei da mesa milanesa, reconhecido inclusive fora das suas fronteiras, é o famoso risotto allo zafferano (ao açafrão). A lenda conta que em meados de 1500, na Fabbrica del Duomo, havia uma comunidade de belgas guiados por Valerio di Fiandra, cuja missão era pintar os vidros da igreja com episódios da vida de Santa Helena. Entre os seus discípulos havia um jovem dotado de muito talento, que conseguiu impressionar ao mestre graças às cores que conseguia através do açafrão. Assim, no dia do casamento da filha do mestre vidraceiro, o discípulo conseguiu convencer os cozinheiros a misturar o açafrão com o arroz e servi-lo aos convidados. O sucesso obtido pelo prato, servido daquela forma, foi tão surpreendente que desde então o risotto alo zafferano faz parte dos pratos clássicos da cozinha milanesa.
Quase ao mesmo nível deste prato, quanto a prestígio e notoriedade, encontramos o Panettone. Doce típico das festas de Natal comemoradas na península, é o típico capricho que não pode faltar na mesa dos italianos. Como a maioria das receitas destinadas à fama, acerca do Panettone também existem várias lendas. A primeira é sobre o cozinheiro Ludovico il Moro, a cargo de um sumptuoso almoço natalício, comemorado na presença dos nobres mais importantes da corte de Milão, que queimou o doce que havia preparado. O seu ajudante, Toni, ofereceu-lhe o que tinha sido cozinhado por ele próprio, com as sobras da comida: um pão com ovos, farinha, manteiga e algumas uvas passas. O cozinheiro, que não tinha outra opção, decidiu arriscar-se e levar este doce à mesa dos seus senhores. A reação destes foi tão entusiasmada que quando lhe perguntaram pelo nome do bolo, Ludovico respondeu: “L'è 'l pane di Toni”, ou seja “é o pão do Toni”. Da mesma forma, há outra lenda protagonizada por um padre e uma mulher que o visitou durante a época de Natal, para que este desse a sua bênção ao doce que ela tinha preparado. O padre, que após cada oração dava uma generosa mordida no bolo, acabou por comê-lo todo. O dia em que a mulher regressou para recolher o seu doce, que calhou com a comemoração de São Biagio, no dia 3 de fevereiro, o padre ficou muito arrependido pelo ocorrido, assim que pediu clemência ao Santo. Este, sempre bondoso às penas dos homens e à pequenez das suas vidas, concedeu-lhe um bolo maior, saboroso e recheado de uvas passas. Desde então, um costume típico em Milão consiste em guardar um pedaço do Panettone que se distribuiu durante o Natal e, comê-lo em jejum com toda a família no dia 3 de fevereiro, uma vez este ato simboliza um gesto contra os pecados da gula e dos males da garganta e do resfriado. Além disso, é justamente neste dia quando os comerciantes da cidade colocam à venda os chamados Panettones de São Biagio, a um preço notoriamente mais barato.
Deixando de lado a capital Lombarda, e os seus comércios, e fazendo um percurso pelos seus arredores, descobrimos paisagens rodeadas de lagos e montanhas, com um encanto realmente especial. É precisamente nestes vales, da Valcamonica e de Valtellina, de onde provém outras receitas, muito contundentes, da gastronomia lombarda. É o caso dos pizzoccheri, uma massa curta elaborada com farinha de trigo sarraceno, manteiga e servida com batatas e couve branca. Da mesma forma, também cozinhada e muito apreciada em outras regiões de Itália, temos a polenta, à base de farinha de cereais e milho, que se caracteriza por ser considerado um prato pobre, ou exatamente o contrário! Porque se a polenta é servida “viúva”, ou seja, sem estar acompanhada de nenhum condimento, é considerada uma receita humilde. Pelo contrário, servida com queijo gorgonzola derretido por cima e acompanhada com fungos e linguiça, é um autêntico luxo! A propósito, em Milão costumam comê-la à sexta-feira.
Milão oferece infinitas possibilidades, tanto a nível gastronómico, cultural e de lazer. No seu passado, radicam rituais e tendências que hoje, mais do que nunca, estão na moda. Por isso, na nossa próxima publicação, vamos contar a verdadeira história do petisco milanês!
45.4654219, 9.1859243
Milán
É a maior cidade da Itália setentrional e a segunda cidade de Itália por população, capital da província de Milão e da região de Lombardia. Está localizada na planície paduana, uma das regiões mais desenvolvidas de Itália.
População: 1.345.890 hab.
Superfície: 181,76 kmª
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